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domingo, 14 de agosto de 2011

Gravidez abdominal intraligamentar avançada


Gravidez abdominal intraligamentar avançada - relato de caso
Suzane Holzhacker; Júlio Elito Junior; Renato Martins Santana; Wagner Hisaba


Introdução
A gravidez intraligamentar é uma forma rara de gravidez ectópica com incidência reportada de uma em 245 gestações ectópicas8. Geralmente, resulta da penetração trofoblástica de uma gravidez tubária através da serosa para a mesossalpinge, com implantação secundária entre as folhas do ligamento largo5. A placenta ocupa, em geral, um lugar mais cranial em relação ao feto e pode invadir o espaço intraligamentar, ovário, útero, omento, peritônio pélvico e vísceras adjacentes8.
Alguns fatores de risco citados são idade avançada, raça não-branca, cirurgia pélvica pregressa, história de infertilidade, história de doença inflamatória pélvica, gestação ectópica ou endometriose prévia6.
Os sinais que podem sugerir uma gestação abdominal são sangramento vaginal anormal, dor abdominal, movimentos fetais dolorosos, fácil palpação das partes fetais, náusea e vômito excessivos, evidência de restrição de crescimento intra-uterino, oligoâmnio e falha de resposta à ocitocina ou prostaglandina2. As principais complicações antenatais incluem dor abdominal, ruptura do saco gestacional com hemorragia para a cavidade peritoneal, sangramento vaginal, apresentação anômala, insuficiência placentária e óbito fetal6.

Relato de Caso
Paciente de 20 anos, parda, casada, primigesta, é transferida de outro hospital com o diagnóstico de gravidez ectópica abdominal. Paciente com antecedente de infertilidade, apresentou quadro clínico de forte e súbita dor no hipogástrio com 10 semanas de idade gestacional. Evoluiu com dor contínua no hipogástrio, sendo identificada gestação tópica e oligoâmnio absoluto no último ultra-som. Foi realizado novo exame, sendo identificada prenhez abdominal parauterina direita, feto com biometria de 16 semanas, placenta inserida no mesossalpinge e oligoâmnio severo.
A paciente foi transferida para este serviço com 18 semanas, sendo realizada complementação diagnóstica. Ao exame físico, PA: 100x70 mmHg, FC: 84 bpm, corada, palpando-se no abdome uma tumoração em hipogástrio até cicatriz umbilical, móvel e pouco dolorosa. No toque vaginal, notava-se abaulamento de fundo de saco posterior e lateral direito e o colo voltado para parede vaginal lateral direita. Ao ultra-som, visibilizava-se placenta com proximidade à artéria íliaca direita e feto com batimentos cardíacos, mas com deformidades estruturais ósseas, além da ausência de líquido amniótico. Foi realizada ressonância magnética (Figura 1), que confirmou gestação ectópica abdominal, observando-se placenta na parede anterior do abdome, na região umbilical, estendendo-se lateralmente para a direita e caudalmente. Na avaliação fetal, demonstrado dolicocefalia, sinais de hipertelorismo e feto em posição de hiperflexão.


Conforme prognóstico fetal reservado e possibilidade de grande proximidade da placenta aos vasos ilíacos e, conseqüentemente dificuldade intra-operatória na retirada da placenta, foi realizada arteriografia (Figura 2), com o objetivo de avaliar inserção da placenta. Visualizado ramo da artéria ilíaca interna direita nutrindo a placenta ectópica. Realizada embolização com gelfoam e coils, resultando em trobose parcial da artéria, reenchida distalmente por colaterais.


Realizado preparo intestinal e posteriormente laparotomia exploradora (Figura 3) sendo realizado diagnóstico de gravidez intraligamentar. Após lise de aderências, de omento e de apêndice, realizada ligadura dos vasos do infundíbulo que nutriam a massa, sendo completado o procedimento com a remoção do anexo direito (salpingooforectomia direita), apendicectomia (massa aderida ao apêndice) e do feto. O feto pesou 250 gramas, não havia sinais de vitalidade ou evidências de malformações, apenas uma deformidade do membro inferior esquerdo com pé flexionado (Figura 4).





O resultado anatomopatológico foi de gravidez ectópica abdominal secundária caracterizada por placenta com implantação na parede tubária e peritônio. Identificada área de hematoma em organização com necrose do tecido placentário, adjacente à implantação tubária e às margens de ressecção cirúrgica consistente com sítio de ruptura. Demonstradas aderências peritoneais com decidualização da subserosa envolvendo apêndice cecal, ligamento redondo, mesossalpinge e vasculatura do infundíbulo pélvico.
A evolução de pós-operatório foi adequada, houve queda de 1 mg/dl de hemoglobina, não sendo necessária transfusão sangüínea. A paciente recebeu imunoglobulina anti-D por possuir tipagem sanguínea tipo O negativo e coombs indireto negativo. Evoluiu com negativação dos títulos de β-hCG. Realizou histerossalpingografia após três meses da intervenção, demonstrando permeabilidade tubária esquerda e cavidade uterina normal.

Discussão
A gravidez intraligamentar é limitada anteriormente e posteriormente pelos folhetos do ligamento largo, medialmente pelo útero, lateralmente pela parede pélvica e inferiormente pelo músculo levantador do ânus8. Baseado no quadro relatado, a patogênese da gravidez abdominal neste caso foi de implantação secundária a gestação tubária. No nosso caso, o diagnóstico de gravidez intraligamentar foi realizado no intra-operatório, confirmando que este diagnóstico é raramente definido antes da intervenção cirúrgica6.
Durante o ato operatório, a placenta deve ser preferencialmente removida, para diminuir risco de peritonite, abscesso, coagulação intravascular disseminada e doença trofoblástica persistente2. Nas outras formas de gestação abdominal, a placenta pode ser de difícil remoção, podendo ser mantida para posterior ressecção caso necessária, mas na gestação intraligamentar costuma ser mais facilmente removida5.
O objetivo da realização da arteriograia foi definir a proximidade da placenta aos vasos pélvicos, prever possíveis complicações durante a remoção da placenta e embolizar ramos que nutriam a placenta. Assim, como neste caso descrito, a embolização pré-operatória da vasculatura da placenta pareceu limitar a perda de sangue no intra-operatório e prevenir hemorragia pós-operatória no caso de gravidez abdominal descrito por Cardosi1. O controle da hemorragia demonstra a importância da arteriografia e embolização anterior à cirurgia.
Em relação à mortalidade, há poucos casos para definir quanto à gestação intraligamentar, mas a gravidez abdominal apresenta risco de mortalidade 7,7 vezes maior que a gestação tubária e 90% maior que a gestação intra-uterina4. Desta forma, demonstra-se a importância do exame ultra-sonográfico minucioso de primeiro trimestre para identificar saco gestacional intra-uterino. A abordagem dos casos de gestação abdominal deve ser realizada preferencialmente em centros terciários, acompanhado por uma equipe multiprofissional (tocoginecologista, cirurgião geral e radiologia intervencionista).
A gravidez intraligamentar é condição de alta morbi-mortalidade materna, sendo imperativo para um desfecho favorável uma avaliação pré-operatória e técnica cirúrgica adequadas.

Referências
1. Cardosi RJ, Nackkley AC, Londono J, Hoffman MS. Embolization for advanced abdominal pregnancy with a retained placenta. A case report. J Reprod Med. 2002 Oct; 47(10):861-3.         [ Links ]
2. Farag GE, Ray S, Ferguson A. Surgical packing as a means of controlling massive haemorrhage in association with advanced abdominal pregnancy. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2003 Jul 1; 109(1):106-7.         [ Links ]
3. Job-Spira N, Bouyer J, Pouly JL, Germain E, Coste J, Aublet-Cuvelier B, Fernandez H. Fertility after ectopic pregnancy: first results of a population-based cohort study in france. Hum Reprod. 1996 Jan:11(1):99-104.         [ Links ]
4. Martin JN, Sessums JK, Martin RW, Pyror JA, Morrison JC. Abdominal pregnancy: current concepts of management. Obst Gynecol. 1988 (71): 549-57.         [ Links ]
5. Paterson WG, Grant KA. Advanced intraligamentous pregnancy. Report of a case, review of the literature and a discussion of the biological implications. Obstet Gynecol Surv. 1975 Nov; 30 (11):715-26.         [ Links ]
6. Phupong V, Lertkhachonsuk R, Triratanachat S, Sueblinvong T. Pregnancy in the broad ligament. Arch Gynecol Obstet. 2003 Aug; 268 (3):233-5.         [ Links ]
7. Phupong V, Terasakul P, Kankaew K. Broad ligament twin pregnancy. A case report. J Reprod Med. 2001 Feb;46(2):144-6.         [ Links ]
8. Ziel HK, Miyazaki FS, Baker TH, White JD. Advanced intraligamentary pregnancy. Report of a case with survey to date. Obstet Gynecol. 1968 May; 31(5): 643-8        [ Links ]


Trabalho realizado pelo Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina, São Paulo, SP

Um comentário:

  1. Uma prova que a gravidez para se chegar ao termo, não há como descartar um conumbio, não tem como acontecer apenas de uma parte, TEM que ter a intervenção Homem x Mulher nem que seja por contato apenas de gametas. Mas não existe ainda a possibilidade do contrário e ela tem que acontecer pelos canais oficialmente legais; invaginação. E para se desenvolver nada como o útero quentinho da MULHER.

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